O autor, atualmente pastor em Toledo/PR, passou 1989 e 1990 em Cuba. Seu artigo quer nos dar um breve apanhado sobre a história do socialismo em Cuba, bem como destacar os atuais desafios que para o regime e a Igreja se levantam a partir da nova conjuntura mundial. Neste sentido nos parecem pertinentes as reflexões feitas por Frei Betto no editorial do Jornal Sem Terra (set./out. 91, p. 2), que transcrevemos abaixo: Há cerca de 100 anos a América Latina adota o livre mercado, o pluralismo partidário, o sufrágio universal, como forma de assegurar a primazia do capital privado. E quando essa primazia sofre ameaças, os generais de plantão entram em cena, para pôr as coisas em ordem. No entanto, a miséria atinge a grande maioria das 525 milhões de pessoas que vivem na América Latina e Caribe. Exceto em Cuba, o único país socialista do continente, a pobreza, como carência de bens imprescindíveis à sobrevivência, é regra e não exceção. Por cada 1.000 crianças nascidas vivas, morrem no primeiro ano 61 no Brasil, 53 no México, 85 no Peru e apenas 12 em Cuba. A democracia existente no Sul do mundo é ótima para encher umas e os cofres dos privilegiados, mas não enche barrigas. No Norte, ela traz bem-estar às custas da opressão do Terceiro Mundo, da extorsão da dívida externa e das guerras intervencionistas. Não é a democracia, como regime do povo para o povo, que interessa ao Grupo dos 7 países mais ricos do mundo. Democracia, para o presidente Bush, é tudo isso que favorece a acumulação do capital privado e, sobretudo, o esplendor do império dos EUA. O Evangelho diz que ninguém pode servir a Deus e ao dinheiro. Para Jesus, o critério absoluto é a vida humana. Nenhum regime é suficientemente bom se não assegura, primeiro, a sobrevivência biológica de seus habitantes. O capitalismo é ótimo para os ricos e para quem nutre a ilusão de ficar rico, assim como o apartheid convém à minoria branca da África do Sul. Porém, o cristianismo proclamou a dignidade sagrada de todo ser humano, condenando o branco que discrimina o negro, o rico que oprime o pobre, o homem que humilha a mulher, o ambicioso que extermina índios. Todos os que sonham com um mundo diferente precisam pôr os pés no chão e a cabeça no lugar. O que interessa primeiro não é se na Rússia haverá 10 partidos políticos ou se as crianças de Pequim poderão visitar a Disneylândia. A liberdade começa com a satisfação da necessidade. Pode ficar mais livre um mundo que fica mais pobre? E como erradicar a pobreza sem repartir os muitos bens que se acumulam em mãos de poucos? Para quem vive num país de 100 milhões de pobres, o socialismo não deve ser uma nódoa do passado, mas um sonho de futuro.
Palavras-chave
Cuba; Igreja e problemas sociais; Socialismo e religião; Igreja e estado